Patricia de Almeida Catarino - CGI Partner | Senior Vice President Consulting Services
Publicado a 26 de setembro de 2025 | Jornal Económico

Num contexto em que as expetativas dos cidadãos relativamente aos serviços digitais públicos continuam a aumentar e os governos enfrentam o desafio de responder a exigências políticas cada vez mais complexas, com restrições orçamentais significativas, a capacidade de adaptação rápida tornou-se uma prioridade estratégica. Simultaneamente, a confluência de fatores como a obsolescência das infraestruturas tecnológicas, o agravamento das ameaças cibernéticas, o ‘gap’ demográfico e a escassez de talento qualificado impõem a necessidade urgente de modernização estrutural da administração pública.

Anualmente, conduzimos um estudo global onde damos voz aos nossos clientes para que partilhem as suas maiores preocupações, prioridades e desafios. Em 2025, questionámos mais de1.800 gestores — dos quais 266 pertencentes à administração pública central — que identificaram três tendências que estão a moldar o futuro do setor público:

  • Aceleração da transformação digital e a substituição de sistemas obsoletos para melhorar a eficiência e a segurança dos serviços públicos, e ampliar a sua capacidade operacional. Mais de 70% dos inquiridos apontam a modernização tecnológica como a principal macrotendência com impacto no setor. No entanto, apenas 43% afirmam estar a alcançar resultados mensuráveis com as suas estratégias de digitalização, o que evidencia a necessidade de reforçar a eficácia da sua implementação.
  • Adoção de modelos escaláveis e adaptáveis: a volatilidade política e fiscal afeta diretamente os processos de decisão, devido à instabilidade dos contextos políticos e regulamentares. Tal realidade exige que os líderes públicos adotem modelos organizacionais ágeis, capazes de se ajustar a mudanças de liderança, variações macroeconómicas, alterações nos mecanismos de financiamento e a novas exigências de conformidade.
  • Escassez estrutural de talento: cerca de metade dos entrevistados identificam o envelhecimento da força de trabalho e as dinâmicas demográficas como obstáculos significativos à captação de profissionais qualificados. Embora iniciativas de requalificação e parcerias estratégicas contribuam para mitigar este desafio, estas medidas revelam-se insuficientes por si só para garantir a sustentabilidade do capital humano no setor público.

Porque estas tendências são importantes e por onde começar?

O Relatório da União Europeia (UE) sobre o desempenho de Portugal face às metas da Década Digital 2025 evidencia progressos encorajadores, nomeadamente no que se refere ao aumento do número de especialistas em tecnologias de informação e comunicação (TIC), com uma participação crescente de mulheres. No entanto, as competências digitais básicas da população continuam abaixo da média europeia. Para mitigar a escassez de talento qualificado, temos de manter o foco no investimento em formação contínua e na definição de percursos de carreira atrativos e estruturados. Hoje, mais do que nunca, o mercado tecnológico é um mercado global e cabe a cada país criar atratividade para reter e colmatar as lacunas de competências. As empresas, universidades, escolas secundárias e o estado devem juntar sinergias por forma a desenhar o conhecimento no país. Parcerias estratégicas são cruciais para fazer acontecer, mas não são uma solução por si só.

No domínio tecnológico, a modernização dos sistemas legados deve ser encarada como uma prioridade. Estes sistemas, que são frequentemente dispendiosos, vulneráveis e inflexíveis, representam um entrave à transformação digital. De facto, 72% dos inquiridos identificaram os sistemas antigos como um obstáculo “moderado a significativo” à concretização das suas estratégias de digitalização.

O mesmo relatório da UE sobre Portugal assinala um crescimento consistente na disponibilização de serviços públicos digitais, destacando-se o bom desempenho no que se refere ao acesso a registos de saúde eletrónicos e à utilização de redes de conectividade modernas. No entanto, são identificados desafios significativos na adoção de tecnologias de inteligência artificial (IA). A sua implementação exige uma base sólida de governação de dados, mecanismos robustos de supervisão ética e equipas técnicas altamente qualificadas.

A modernização tecnológica e o a democratização da IA é a base da construção das instituições do futuro. Tecnologia, Talento e Governação são a os pilares desta transformação que deve acima de tudo ser sempre centrada nos clientes e/ ou cidadão.

A adoção de tecnologias digitais avançadas, com especial enfoque na IA, deve ser encarada como uma prioridade estratégica, sustentada por metas claras e colaboração entre setores. O contexto é propício — é tempo de agir com visão e compromisso sustentável sempre com vista a construir um futuro onde todos gostaríamos de viver.